Os deputados estaduais da base mostraram, nesta terça-feira (01), que não estão dispostos a seguir, fielmente, entendimentos ou a direção do governo quando eles têm outras convicções sobre determinados temas.
A prova disso ocorreu na votação do veto do governador João Azevêdo (Cidadania) ao projeto que trata da formação, pesquisa e apoio a milhares de paraibanos, com doenças crônicas, graves e incapacitantes que precisam da cannabis medicinal para aliviar dor e ter mais qualidade de vida.
Dos 35 parlamentares presentes, 30 votaram pela derrubada do veto. Incluindo governistas. Três deputados, Wilson Filho (PTB), Júnior Araújo (Avante) e Hervázio Bezerra (PSB) se abstiveram; Ricardo Barbosa (PSB) faltou à sessão; e dois deputados votaram contra o projeto: Cabo Gilberto (PSL) e de Jutay Meneses (PRB).
O projeto 1920/20, de autoria da deputada Estela Bezerra (PSB), havia sido aprovado pelos parlamentares, mas vetado pelo governo, com alegação de que era inconstitucional.
Uma das razões, segundo parecer jurídico, foi a de que compete à União estabelecer normas gerais sobre o uso da cannabis. Também alegou que a lei impõe atribuições administrativas ao estado, o que, constitucionalmente, o legislativo não pode fazer. Há “um vício de origem”, diz o parecer.
“Apesar do já comprovado potencial terapêutico das diversas variedades de cannabis, o acesso pleno aos tratamentos e pesquisas com esta planta tem sido dificultadas, principalmente pela falta de informação, pelo preconceito e por interesses de grupos econômicos específicos, inviabilizando o avanço de políticas públicas nesta área”, explicou a Estela.
Posicionamentos
O presidente da Assembleia Legislativa, Adriano Galdino (PSB) não só votou a favor do projeto, como argumentou que a Casa deve tomar para si a iniciativa de mediar as negociações com o governo para a implantação das ações.
O deputado Wallber Virgulino (Patriota) disse que conversou com alguns pais e conheceu a realidade de quem precisa dos medicamentos à base de cannabis e, por isso, adotou a postura favorável. Segundo ele, a lei estadual aprovada não tem poder de liberar o uso recreativo, ponto de suas críticas a iniciativas nessa linha.
Jutay Menezes, que votou contra, afirmou que há depoimentos de médicos da Paraíba que afirmam que o instituto autorizado a produzir o óleo da cannabis não tem a condição técnica de recolher o produto puro e que ele é viciante.
Galdino rebateu: “muitas drogas que são liberadas para o comércio farmacêutico e usamos são viciantes. Vale mais o beneficio”.
Vale lembrar que produtos derivados da cannabis medicinal já são regulamentados no país pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O debate nacional, agora, é para autorização para cultivo da maconha por empresas para produção de medicamentos.
Famílias que precisam dos medicamentos lembram, por exemplo, que o THC, componente contido na planta, extrato bruto, é fundamental para produção que será usada de maneira controlada por pessoas acometidas de várias doenças, como epilepsia, autismo, depressão, esclerose múltipla, artrite reumatoide, câncer.
Líder do governo
O líder do governo, Wilson Filho, evitou entrar em confronto com o governo e com as suas convicções. Acabou se abstendo. Afirmou que o mérito do projeto era inquestionável por causa do benefício que pode trazer aos pacientes, mas afirmou que há problemas formais, de vício de origem.
“Estamos a disposição total aos representantes da Liga para encontrar uma solução, independente do resultado da votação”, disse (não tinha concluído a votação).
Mobilização
Desde que o projeto foi vetado, há mais de 15 dias, a Associação Liga Canábica e integrantes de outros grupos mobilizam a sociedade, fez contatos com parlamentares, por telefone e e-mails, para sensibilizá-los e mostrá-los a importância do projeto.
A liga Canábica é uma associação sem fins lucrativos que reúne pacientes e familiares, profissionais de diversas áreas, estudantes, pesquisadores, ativistas, políticos e demais cidadãos e cidadãs, que acreditam no potencial terapêutico da cannabis.
“Foi duro, mas conseguimos. É um projeto bem avançado, considerando as limitações da Lei Federal. Tivemos grande apoio do gabinete da deputada Estela Bezerra, autora do projeto e do movimento de mobilização social Minha Jampa. Mas, principalmente, dos pacientes de cannabis terapêutica que se mobilizaram compartilhando as postagens, enviando mensagens aos deputados e deputadas, e atuando em favor do projeto”, afirmou Júlio Américo, um dos fundadores da Liga Canábica.